Hoje mergulhamos no fascinante mundo da anfetamina e sua versão moderna, a Lisdexanfetamina(Venvanse). Vamos explorar desde a descoberta histórica até as complexidades do seu mecanismo de ação, efeitos adversos e usos clínicos.
A Jornada Histórica da Anfetamina
A anfetamina, descoberta em 1887 pelo químico romeno Lazare Edeleano, inicialmente não tinha aplicações farmacológicas conhecidas. Sua história na indústria farmacêutica começou na década de 1920, quando Gordon Alles sintetizou a substância em busca de um tratamento para a asma. Interessante notar que a efedrina, a substância que inspirou Alles, é derivada da planta chinesa Ephedra vulgaris. Em 1934, a Smith, Kline and French começou a comercialização da anfetamina sob o nome de Benzedrina, inicialmente indicada para narcolepsia, depressão leve e outras condições.
A Descoberta do Uso no TDAH
Uma virada significativa ocorreu em 1937, quando Charles Bradley descobriu acidentalmente os efeitos benéficos da Benzedrina em crianças com comportamentos disruptivos, um marco no entendimento e tratamento do TDAH.
Mecanismo de Ação Detalhado
A anfetamina é uma amina simpatomimética, não catecolaminérgica, que estimula o sistema nervoso central. Diferente de substâncias como o metilfenidato e a cocaína, que bloqueiam a recaptura de dopamina e noradrenalina, a anfetamina promove o transporte reverso destes neurotransmissores. Especificamente, ela atua como um falso substrato, sendo recapturada pelo transportador de dopamina e noradrenalina e aumentando o efluxo destes neurotransmissores das vesículas sinápticas. Esta ação resulta em um aumento da dopamina e noradrenalina no espaço sináptico, proporcionando um efeito estimulante mais potente do que o metilfenidato, embora isso não implique necessariamente em maior eficácia clínica.
Farmacocinética e Comparação com Outros Estimulantes
A Lisdexanfetamina, disponível no Brasil, é uma pró-droga da dextroanfetamina. Seu metabolismo envolve a hidrólise enzimática nos eritrócitos, liberando dextroanfetamina. Este processo confere à droga um início de ação mais lento e um perfil de liberação prolongado, reduzindo os riscos de abuso e uso recreativo. Comparativamente, a Lisdexanfetamina tem uma meia-vida de 16 a 30 horas, enquanto a dextroanfetamina tem uma meia-vida de 8 a 9 horas.
Efeitos Adversos e Monitoramento
Os efeitos colaterais comuns da Lisdexanfetamina incluem diminuição do apetite, aumento da frequência cardíaca e pressão arterial, agitação, nervosismo, insônia e ansiedade. O monitoramento da pressão arterial é essencial, especialmente em pacientes com riscos cardíacos. Em crianças, há uma preocupação especial com o impacto no crescimento e desenvolvimento, recomendando-se acompanhamento regular.
Indicações Clínicas e Dosagem
A principal indicação da Lisdexanfetamina é o tratamento do TDAH, aprovado pelo FDA em 2007. Em 2014, ela também foi aprovada para o tratamento do transtorno da compulsão alimentar. A dosagem varia de paciente para paciente, seguindo o princípio de 'start low, go slow', para encontrar a dose ótima sem exacerbar os efeitos colaterais.
Contraindicações e Precauções
As contraindicações incluem hipertensão arterial grave, cardiopatias, hipertireoidismo descontrolado, glaucoma, epilepsia não controlada, mania e psicose ativa. É necessário ter cautela no uso durante a gravidez e lactação, devido ao risco de síndrome de abstinência no neonato e impactos no crescimento fetal.
Conclusão
A anfetamina e a Lisdexanfetamina, com suas histórias ricas e complexidades farmacológicas, continuam a ser pilares na psicofarmacologia moderna. Seu uso, embora benéfico em muitos casos, exige um conhecimento profundo e monitoramento cuidadoso. Como sempre, na psicofarmacologia, a chave é a personalização do tratamento para cada paciente.
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